Há quase dez anos
Um parque e seus dramas
Problemas com a iluminação, pavimento, banheiros e acessibilidade transformam, por vezes, a área em um local deserto
Gabriel Huth -
O Parque Dom Antônio Zattera é um importante reduto verde no centro de Pelotas. Entre as ruas Padre Anchieta, Andrade Neves, Doutor Amarante e avenida Bento Gonçalves, é um destino para pessoas de todas as idades que buscam o contato com o ar livre. No entanto, problemas com a iluminação, pavimento, banheiros e acessibilidade transformam, por vezes, a área em um local deserto. Sem ocupação de pessoas, a sensação de insegurança aumenta. E cada vez mais diminui a vontade de frequentá-lo. Urbanistas destacam a necessidade de uma revitalização, diferente daquela feita em 2009, que dialogue e atenda as prioridades da população.
A antiga praça Júlio de Castilhos já foi conhecida como Praça dos Macacos, referência ao tempo em que havia ali um zoológico. Foi, há algumas décadas, o principal ponto da cidade. Testemunhou o crescimento de gerações. Hoje, poderia ser um espaço para reunião intergeracionais, com atividades para todas as faixas etárias. Há o playground e o parque de diversões para os pequenos, pista de skate para os jovens e aparelhos de exercícios aos idosos. Os problemas estruturais dificultam o acesso às diferentes faixas etárias e locais do parque. O que se vê são alguns espaços desertos e outros ainda ocupados pelas pessoas.
Atualmente, a ocupação no parque é muito restrita aos finais de semana, quando pessoas se reúnem no Altar da Pátria ou levam os filhos para brincar. Urbanista e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (Faurb) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Adriana Portella aponta alguns problemas que poderiam ser solucionados e trariam o movimento de volta ao local. “A falta de iluminação e de pessoas geram essa sensação de insegurança. Idosos que moram perto não frequentam justamente por isso”. Ela cita como exemplo a praça Coronel Pedro Osório, tomada pela população até o final da noite com a iluminação de Natal.
Adriana coordena um trabalho de mestrado sobre acessibilidades em parques. Ela e a aluna Lívia Fernandes usaram o Dom Antônio Zattera como exemplo e fonte de entrevistas. Foi constatado que os setores frequentados pela população são aqueles mais próximos às calçadas que circulam o parque e onde há equipamentos, como a pista de skate e o playground. Além do Altar da Pátria, local onde as pessoas se reúnem, por exemplo, para tomar chimarrão.
“O parque tem um valor paisagístico muito importante para a cidade, mas ele precisa ser revitalizado. Estudar os caminhos já formados e pavimentar eles, fazer com que as pessoas se interessem pelo espaço. O que vemos é um local não-convidativo, que as pessoas não têm interesse de usar. Tem que haver essa comunicação, entender o que a população precisa e quer”, analisa Adriana. Nas proximidades do parque estão um lar de idosos e a escola para deficientes visuais Louis Braille. Com o estudo voltado à acessibilidade, ela e Lívia comentam que poderia ser o parque uma importante alternativa de lazer a estes dois públicos. Mais uma vez, a falta de estrutura é um problema.
“Como não há caminhos pavimentados, a dificuldade de locomoção desses grupos é muito difícil dentro do parque. Não há nem como chegar até o banheiro, por exemplo”, comenta Adriana. “Quando fomos até o Louis Braille conversar, vimos a receptividade das pessoas, porque elas nunca tinham sido consultadas antes.”
O Parque para as pessoas
Diferentes motivos levam as pessoas ao Dom Antônio Zattera. Adultos e idosos aproveitam a área verde para fazer exercícios ou levar filhos e netos para passear. Jovens passam as manhãs e as tardes na pista de skate, recentemente reformulada. Os bancos, distribuídos ao longo do parque, servem para as rodas de conversa e o mate. As crianças brincam no playground, jogam futebol na quadra de areia, praticamente abandonada. Aos fins de semana, o parquinho, concessão da prefeitura à iniciativa privada, é outra atração bastante procurada. Essa abrangência de públicos, para Adriana Portella, dá vitalidade ao local. “Para jovens e idosos é muito importante esse contato com outras gerações”, afirma.
Para o aposentado Ivan Saul, 58, é a tranquilidade o principal atrativo. Ele mora a poucas quadras do parque, na rua Doutor Amarante. Todas as manhãs, sai apenas na companhia da térmica e da cuia para o que considera uma hora sagrada: a do mate. Sozinho, como gosta, aproveita o contato com a natureza, algo que sente falta dos tempos em que morava na zona rural. “Venho praticamente todos os dias às oito da manhã para caminhar e tomar o meu mate”, comenta. Ele também frequentava o local quando era criança. “Esses eucaliptos já eram grandes. É uma referência que eu tenho daqui. A impressão é que hoje em dia tem mais cara de parque, mas é menos seguro. Vemos menos a presença do aparato policial.”
Sobre a insegurança, Ivan diz que já foi abordado por uma pessoa no meio do parque, por volta das sete horas da manhã. “Era um homem aparentemente voltando de uma festa, ele veio em minha direção e eu saí fora. Pode ser que não fosse nada, mas me senti intimidado. E sei de outras pessoas que também se sentem assim”, destaca. Por questões como essa, ele começou a frequentar o parque somente a partir das 8h, quando há maior movimento de pessoas.
Como ponto de encontro
A história de Rosane Rossales, 45, se confunde com a do parque. Ela frequenta o local desde criança. Foi ali, inclusive, onde conheceu o marido. Atualmente ela leva o filho de 14 para andar de skate, junto com o marido e com a sogra, Marli Quevedo, 79. Também usa o espaço para caminhadas durante a manhã. “Não deixo meu filho vir sozinho, acho muito perigoso. Quando venho caminhar, procuro sempre vir pelas manhãs, depois das sete e meia, quando há maior movimentação de pessoas. Vemos muita movimentação suspeita e pouco policiamento”, argumenta.
Marli Quevedo, assim como a nora, também frequenta o parque desde pequena. A bicicleta dos tempos de criança deu lugar aos bancos sob a sombra das árvores. O costume de aproveitar o ar livre se manteve na família. Sobre os tempos passados, ela lembra da praça Júlio de Castilhos, um point em Pelotas. “Era muito mais cheio. Era o que tinha para fazer na cidade.”
Sem novos projetos
Apesar dos pontos abordados por urbanistas para melhorias do Dom Antônio Záttera, a Secretaria de Qualidade Ambiental (SQA) informa que não há intenção de uma nova revitalização no local. O secretário Felipe Perez destaca a importância do parque como um espaço verde no centro da cidade. Sobre as questões de problemas de acessibilidade e iluminação, eles teriam que ser estudados em um novo projeto, o que não é prioridade agora. “No momento, o foco é na inauguração de novas áreas nos bairros da cidade”, afirma Felipe Perez.
Responsável pela manuntenção, a Secretaria Municipal de Servições Urbanos e Infraestrutura (SSUI), diz que a varrição no local é diária e o corte da grama é feito de 15 em 15 dias. Sobre os banheiros, o secretário Jeferson Dutra afirma que os cuidados são “paliativos”, com a troca de vidros, grades e torneiras alvos de vandalismo. “Em um segundo momento seria interessante a melhora do parque, mas em relação à limpeza e manutenção o parque tem se mantido”, analisa.
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